Tenho pensado muito a respeito de como tenho investido minha energia e na maneira como as coisas a recebem. Mais do que fazer uma ponderação a respeito dos seus destinos, trata-se de olhar com atenção a maneira como ela se articula com o mundo. Sim, às vezes é bom tratar da gente com um pouco de distanciamento, observando as vicissitudes de nossas entranhas a partir de um ponto aparentemente descolado. É o famoso sair da ilha para conseguir enxergá-la.
Na maior parte do tempo, as sintonias do mundo parecem estar sobrecarregadas. Estímulos, tarefas, agendas, urgências. O latente da alma vai sendo engolido pela patência das entregas. Os prazos do cansaço vão sendo absorvidos pela disciplina compulsória vazia de propósito. Os olhos me parecem cada vez mais sombreados pela neblina das possibilidades, daquelas que prometem entregar tudo, mas endereçam seus objetivos a um corpo social invisível que já está tomado por vícios e adoecimentos indiferenciáveis. É grave não conseguir diferenciar as fontes de onde emanam nossos objetivos.
Para rechear essa história, poderia falar de sintomas e de recalcamentos, à moda psicanalítica que tanto me tenta por conseguir contornar certos borramentos. No entanto, não é preciso ir tão longe, basta inscrever os pensamentos na dinâmica das prioridades e sentir com a palma da mão seu descompasso quase organizado em direção ao que não diz respeito a quem somos, mas sim a uma embalagem que fomos convencidos a ser.
E então volto regularmente a observar meus investimentos, buscando o discernimento da qualidade do seu tempo e objeto. A tralha mental que vai sufocando os sonhos e a falta de aresta que vai distorcendo as narrativas. Quero poder me narrar sem a pontuação desse tempo que me extrapola, verificando, em retrospectiva, as abordagens que se emancipam pela liberdade de assumirem o que não pretendi ser. Ao descobrir os detalhes de mim, vou subvertendo as histórias que me fizeram acreditar serem as mais importantes, num balanço inconstante que permite o movimento das incertezas.
Agora talvez o desafio seja surpreender a entrega dos investimentos. Deixar de lado as planilhas de controle e entregar-se à ousadia de desordenar os pontos fixos. Além de prejudicar a postura, ficar curvada demais ao mundo traz a desvantagem de limitar o ângulo que o observa. Aliás, é urgente voltar a observar, acionando mais sentidos a participarem da missão de se desarticular um pouco das coisas para capturar com a emoção os velhos argumentos do investido. Façamos um quadro deles se necessário.
As palavras, os transtornos, as explicações vazias e os vazios desinvestidos podem sempre ser remanejados. O grande segredo talvez resida em aprender a despontencializar os efeitos do barulho que nos assola ao invés de tentar aniquilá-lo. Percebo que gastamos muita energia tentando dissolver o que machuca, quando o que se encaixa melhor à dinâmica que nos permeia é desaprender os antigos moldes de se relacionar com as demandas que nos dizem respeito e, sobretudo, com aquelas que não.





